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O Auto da Compadecida (2000)

O Auto da Compadecida – A obra clássica de Ariano Suassuna em sua melhor versão

“O Auto da Compadecida” em poucas palavras …

O Auto da Compadecida é uma comédia baseada na obra de Ariano Suassuna. A história se desenrola em uma pequena cidade do sertão nordestino, acompanhando as peripécias de João Grilo e Chicó, dois amigos pobres que se envolvem em situações hilárias. A trama mescla elementos do folclore brasileiro, como o cangaceirismo e a religiosidade popular, criando uma narrativa única e repleta de humor.

Ao longo do filme, os personagens enfrentam desafios, trapalhadas e dilemas morais, proporcionando uma reflexão sobre a vida e a justiça. A Compadecida, figura mística, testemunha os acontecimentos, entrelaçando o cotidiano dos protagonistas com elementos sobrenaturais.


Análise de “O Auto da Compadecida”

“O Auto da Compadecida” é um dos filmes mais queridos e importantes do cinema brasileiro, baseado na peça homônima de Ariano Suassuna. Lançado em 2000, o filme dirigido por Guel Arraes combina comédia, drama e elementos de crítica social, trazendo à tela uma representação vívida do Nordeste brasileiro. Selton Mello e Matheus Nachtergaele dão vida aos clássicos personagens de Suassuna, Xicó e João Grilo, conquistando tanto a crítica quanto o público com suas atuações sensíveis e hilárias.

Contexto de Produção e Lançamento

“O Auto da Compadecida” foi produzido em um período de revitalização do cinema brasileiro. Nos anos 90, após um período de crise, o cinema nacional começou a se reerguer com o apoio de novas políticas de incentivo e a crescente profissionalização da indústria cinematográfica. O filme foi uma coprodução entre a Globo Filmes e a Lereby Produções, sendo inicialmente lançado como uma minissérie na TV Globo em 1999, antes de ser editado e lançado como um longa-metragem em 2000.

A escolha de adaptar a obra de Suassuna reflete um momento em que o cinema brasileiro buscava valorizar e explorar sua própria cultura e literatura. A peça, escrita em 1955, já era considerada um clássico do teatro brasileiro, reconhecida por sua mistura de elementos populares com uma estrutura narrativa sofisticada e influências da literatura de cordel.

Período Histórico Retratado no Filme

O filme é ambientado no Nordeste brasileiro na década de 1930. Este período é marcado por profundas desigualdades sociais, seca, e a luta pela sobrevivência de muitos nordestinos. O sertão, com suas dificuldades e suas belezas, é mais do que um cenário; é um personagem integral que molda a vida e as atitudes dos protagonistas.

Trama e Personagens Principais

João Grilo (Matheus Nachtergaele)

João Grilo é um personagem astuto e engenhoso, que usa sua inteligência para sobreviver em um ambiente hostil. Ele é um típico anti-herói nordestino, representando a sagacidade e a resiliência do povo sertanejo.

Chicó (Selton Mello)

Chicó, o melhor amigo de João Grilo, é um contador de histórias inveterado e um tanto covarde. Sua ingenuidade e suas histórias fantásticas contrastam com a esperteza pragmática de João Grilo.

Padre João (Rogério Cardoso) e Bispo (Lima Duarte)

Representando a Igreja Católica, esses personagens satirizam a hipocrisia e a corrupção dentro da instituição religiosa, um tema recorrente na obra de Suassuna.

Severino (Marco Nanini)

O cangaceiro Severino é uma figura que encarna a violência e a lei do mais forte, comuns no sertão da época.

Nossa Senhora (Fernanda Montenegro)

Em uma representação inusitada, Nossa Senhora aparece como uma figura compassiva e justa, contrastando com o severo Diabo (Luis Melo) durante o julgamento final dos personagens.

O auto da compadecida
Fernanda Montenegro e Maurício Gonçalves como Nossa Senhora e Jesus Cristo. Uma cutucada no racismo dos religiosos

Elementos Representativos do Período

Sertão Nordestino

A ambientação no sertão é crucial para a narrativa. O filme mostra a aridez, a pobreza e a luta constante pela sobrevivência, mas também a cultura rica e a criatividade do povo nordestino.

Cangaço e Violência

O cangaço, movimento de banditismo social que marcou o Nordeste no início do século XX, é representado pelo personagem de Severino. A presença de cangaceiros ressalta a falta de autoridade estatal e a justiça feita com as próprias mãos.

Religião e Superstição

A religiosidade popular e as práticas supersticiosas são elementos centrais no filme. A fé católica, misturada com crenças populares, é retratada de forma crítica e cômica, mostrando a influência da Igreja na vida das pessoas.

Literatura de Cordel

A influência da literatura de cordel, com suas narrativas rimadas e suas ilustrações típicas, é visível na estrutura do filme. O uso de uma narrativa episódica e a presença do narrador (Denis Carvalho) evocam o estilo dos folhetos de cordel.

Humor e Crítica Social

O filme usa o humor para criticar a desigualdade social, a corrupção e a hipocrisia religiosa. As peripécias de João Grilo e Chicó servem para expor as falhas das instituições e a luta dos marginalizados.

Recepção Crítica e Impacto Cultural

O filme foi amplamente aclamado pela crítica, ganhando diversos prêmios, incluindo o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro. Sua mistura de comédia, crítica social e elementos culturais brasileiros ressoou com o público, tornando-o um sucesso de bilheteria e um marco no cinema nacional.

Reflexões Contemporâneas

Mesmo ambientado em um período histórico específico, “O Auto da Compadecida” aborda temas universais e atemporais. Questões como desigualdade, injustiça e a luta pela sobrevivência são tão relevantes hoje quanto eram na década de 1930. A engenhosidade e a resiliência dos personagens principais refletem a capacidade do ser humano de encontrar humor e esperança mesmo nas situações mais adversas.

Considerações Finais

“O Auto da Compadecida” teve o mérito de conseguir tornar ainda melhor a experiência de conhecer a história de Suassuna, que já era um clássico. O texto, uma combinação de humor, crítica social e riqueza cultural, oferece um retrato profundo e envolvente do Nordeste brasileiro, mas como é escrito em formato de pela de teatro torna-se pouco acessível ao público. Vale lembrar que a peça já teve outras adaptações anteriores, inclusive uma com o quarteto “Os Trapalhões”, mas esta foi a versão que ficou marcada na memória popular.

Através das aventuras de João Grilo e Chicó, o filme explora as complexidades da vida no sertão, criticando instituições e celebrando a resiliência e a criatividade do povo nordestino. A cutucada de colocar Jesus como um homem negro é a última das cartadas da obra, que continua relevante tanto tempo depois. Lançado em 2000, foi mais um ponto forte que serviu para revitalizar o cinema nacional. “O Auto da Compadecida” é um entretenimento de alto nível, mas também é uma aula de história e cultura nordestina e, por que não, do que nos faz humanos.

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