Publicado em 1998, As barbas do imperador: D. Pedro II, um monarca nos trópicos, de Lilia Moritz Schwarcz, é uma biografia inovadora que examina a figura de Dom Pedro II não apenas como um governante, mas também como um símbolo da construção da identidade nacional brasileira. A obra se destaca por sua abordagem que combina história, antropologia e crítica cultural, oferecendo uma análise profunda do significado do imperador dentro do imaginário coletivo brasileiro.
Ao longo do livro, Schwarcz investiga como Dom Pedro II foi representado e se auto-representou ao longo de seu reinado, explorando o papel central que sua imagem desempenhou na legitimação do poder monárquico. A autora argumenta que o imperador cultivou deliberadamente uma persona de soberano ilustrado, racional e distante das extravagâncias típicas das monarquias europeias, buscando projetar uma identidade nacional baseada na ordem e na civilização.
Um dos aspectos mais inovadores do livro é sua análise do uso da imagem do imperador como instrumento político. Schwarcz demonstra como a iconografia oficial, incluindo retratos, fotografias e narrativas jornalísticas, ajudou a consolidar a ideia de Dom Pedro II como um monarca dedicado ao progresso, à ciência e à educação. A famosa figura do imperador com longas barbas brancas tornou-se um símbolo de estabilidade e continuidade, reforçando sua autoridade e o papel paternalista da monarquia.
A obra também destaca as contradições do reinado de Dom Pedro II. Apesar de sua postura modernizadora e de seu incentivo às artes e à ciência, o imperador governava um país profundamente desigual, marcado pela escravidão e por uma elite política conservadora. Schwarcz argumenta que a imagem de Dom Pedro II como um monarca esclarecido muitas vezes encobria essas contradições, ajudando a sustentar uma monarquia que, na prática, excluía a maioria da população da participação política.
Outro ponto crucial abordado no livro é a maneira como Dom Pedro II construiu sua imagem pública em contraposição a outros líderes da época. Diferentemente de imperadores europeus que enfatizavam o luxo e a grandiosidade, ele cultivava uma imagem de simplicidade e austeridade. Esse aspecto era reforçado por seu interesse em ciência e cultura, que o fez ser retratado como um monarca intelectual, mais próximo de acadêmicos e artistas do que da nobreza tradicional.
O livro também explora o impacto da queda da monarquia e do exílio de Dom Pedro II na construção de sua memória histórica. Schwarcz analisa como, mesmo após a Proclamação da República, a figura do imperador continuou a ser reverenciada, muitas vezes associada a um período de estabilidade e progresso perdido. Essa nostalgia monárquica foi alimentada por discursos e imagens que romantizaram seu governo e minimizaram seus desafios.
Ao longo da obra, Schwarcz utiliza uma vasta gama de fontes, incluindo pinturas, fotografias, documentos oficiais e jornais da época, para reconstruir a trajetória do imperador e o significado de sua imagem. Seu estilo de escrita acessível e detalhado torna o livro uma leitura envolvente tanto para historiadores quanto para o público geral interessado na história do Brasil.
As barbas do imperador recebeu o Prêmio Jabuti e se tornou uma referência essencial nos estudos sobre Dom Pedro II e a monarquia brasileira. Mais do que uma simples biografia, a obra convida o leitor a refletir sobre o papel das representações visuais e narrativas na construção da história e da identidade nacional. Com uma abordagem crítica e original, Lilia Moritz Schwarcz oferece uma visão renovada sobre um dos personagens mais emblemáticos da história brasileira.

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