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10 motivos porque meus filhos não querem assistir Indiana Jones

Os velhos fãs de Indiana Jones, que cresceram vendo seus filmes no cinema, ou mesmo nas reprises de sessão da tarde, talvez se surpreendam com a falta de entusiasmo das novas gerações pelo personagem. Como podem não gostar de filmes tão bons, tão marcantes, tão cheios de ação e comédia? Mas o fato é que as crianças parecem não querer assistir mais filmes antigos de Indiana Jones. Prepare-se, porque tem algumas explicações para este mistério.

Por que crianças não querem assistir Indiana Jones? – 10 respostas inquietantes

1. Cenas de ação

Caçadores da Arca Perdida é um filme com ótimas cenas de ação. Em 1981, ano que foi lançado, as referências em termos de ação eram os filmes da coleção 007 e os faroestes, os seriados antigos como Buck Rogers, Flash Gordon, Tarzan, e os quadrinhos. A cena da pedra rolando atrás do Indy, por exemplo, foi retirada de uma história do Tio Patinhas. A indústria de games ainda estava engatinhando. Os grandes jogos do momento eram Space Invaders e Pac Man, que já ditavam um pouco de ritmo na juventude.

A ação de Caçadores segue o ritmo dos seriados antigos que inspiraram Spielberg e Lucas, nos quais uma pequena parte da história é contada, socos são trocados, e o heroi termina sempre numa cena de perigo com a chamada para o próximo episódio: será que nosso heroi conseguirá escapar?

No filme isso acontece várias vezes, com a ação crescendo de ritmo e se tornando mais frenética até chegar na cena do caminhão. Depois disso a trama caminha pro final em tom de suspense, dando descanso ao público e preparando para uma cena típica de filmes de terror, e um final que lembra filmes de espionagem e conspiração governamental.

Tudo isso, muito bem costurado, mecheu com o imaginário da juventude do começo dos anos 80, pois retomava referências emocionais de todo tipo para aquela geração. Dez anos depois, quando assisti pela primeira vez, confesso que achei muito parado e dormi no meio.

Minhas referências já não eram as mesmas, mas como bom cinéfilo que estava me tornando insisti e adorei os filmes, que são até hoje os meus preferidos. Mas um cinéfilo dificilmente pode ser considerado como base para analisar o público como um todo.

2. Efeitos especiais

Spielberg e Lucas ficaram famosos nos anos 80 por sua capacidade de criar efeitos especiais, ou seja, inventar pequenos truques de imagem e de som que faziam o impossivel acontecer diante dos nossos olhos.

Víamos Indy saindo de dentro de uma montanha explodindo água pra todos os lados, ou andando em cima de uma ponte invisível e nossos sentidos diziam que era real, porque não dava pra imaginar como aquela cena tinha sido feita. Era um prazer semelhante ao de ver um mágico no circo fazendo alguém levitar.

Essa indústria cresceu, e hoje vemos seres digitais como Smeagol, Hulk e Thanos feitas de maneira tão realista que todo o resto parecem caixas de papelão, o que de fato eram na maioria das vezes. É fácil para nossos olhos treinados verem os cortes atrás dos atores, e assim momentos dramáticos se tornam risíveis.

Felizmente a elegância com que algumas cenas foram feitas permitem ainda hoje aproveitar o filme, mas é difícil iludir. E sem a ilusão perde-se boa parte da graça.

3. Filme parado


Uma das maiores reclamações dos mais novos é que os filmes dos anos 80 são parados, e Indy não escapa desta classificação. Não se pode dizer que um filme como Templo da Perdição é parado. Ele tem quatrocentas cenas de ação em sequência no começo, cumprindo muito bem a promessa feita na época de trazer uma continuação com mais ação que o primeiro filme. Tem momentos de desenvolvimento dos personagens, mas não chega a ser uma barriga dentro do filme. Mesmo assim ainda é visto como um filme menos movimentado que os de hoje.

Um motivo para isso é a maneira como eles foram filmados. Sem os efeitos digitais que temos hoje, as cenas eram muito mais artesanais, algumas em cenários reais como no caso de Indiana Jones. O objetivo era criar a ação mostrando algo real, e isso era revolucionário pra época. A série Star Trek usava cenários de papelão, enquanto Indy caia de um avião em um bote inflável e era arrastado por um caminhão agarrado a um chicote. A diferença era fantástica, e entusiasmava os fãs de ação.

Hoje os filmes usam efeitos digitais pra criar qualquer coisa, quase como um desenho animado, e impõem o ritmo que querem na cena, sendo a única limitação o dinheiro e o tempo disponível para renderizar. O realismo de uma cena feita com dublês foi substituído pela cadência acelerada que só é possível obter num estúdio com tudo sob controle.

4. Falta de identificação com os personagens


A geração de oitenta se identificava com Indy. Ele era um personagem sem melindres, pronto pra se sujar e se machucar sempre que fosse preciso. Era o contraponto de James Bond, que estava sempre arrumadinho. Ele resolvia tudo na raça e com criatividade, o que era muito valorizado. Outros herois da época tinham traços semelhantes, como Rocky Balboa e MacGyver.

Os anos 2000 viram surgir outros tipos de herói, mais problemáticos e bem treinados, como Ethan Hunt de Missão Impossível ou Jack Bauer de 24 horas. Mas não creio que seja somente por aí a explicação. Os filmes de Indiana Jones falam sobre buscas impossíveis, de pessoas falíveis, de relações amorosas e familiares destruídas pela busca profissional, falava sobre o encontro com exótico, sobre a afirmação de um indivíduo acima de todos os problemas, e de como ele sozinho consegue se sobrepor a tudo.

Essas não são mais discussões do momento, mas eram muito relevantes nos anos oitenta. As buscas impossíveis hoje parecem muito mais fáceis com o Google, os relacionamentos tem novas problemáticas com as redes sociais e as fake news, o exótico deixou de ser tão interessante com a globalização tornando tudo tão exposto a apreciação. E assim chegamos ao próximo item, que é a individualização.

5. Centralização em um único personagem


Os filmes de ação dos anos oitenta carregavam uma ideia, a de que um indivíduo bem motivado poderia fazer a diferença. Seguem essa cartilha filmes como Rambo, Aliens, De Volta Para o Futuro, Conan e, claro, Indiana Jones.

Essa ideia foi mudando nos anos noventa, com filmes que exploravam cada vez mais a pulverização do heroismo entre vários personagens. O culto ao indivíduo foi aos poucos perdendo fôlego, e ganhou força a ideia de que não podemos resolver tudo sozinhos.

Star Wars já antecipava essa premissa lá atrás, e talvez por isso tenha conseguido se inserir tão bem para as novas gerações. Bons exemplos disso também são Parque dos Dinossauros, Independence Day, X-Men, Sociedade do Anel, Vingadores.

Na TV isso foi ainda mais longe, com Tarzan, MacGyver e Magnum sendo substituídos por séries como CSI, Lost, Heroes, Game of Thrones, nas quais não se sabia quem eram de fato os protagonistas, pois qualquer um poderia ser descartado e a trama continuaria.

6. Jogos eletrônicos


Os filmes de Spielberg, como foi dito, se inspiravam nas séries antigas. Contava-se uma história, e havia uma cena de ação para fecha-la. Os filmes dos anos noventa tinham como referência, e concorrência, os jogos eletrônicos,e tiveram que se adequar ao seu ritmo. Nos jogos classicos da Nintendo e da Sega o jogador praticamente ignora a história apertando um botão, e vai pulando pra fase seguinte em busca de mais desafios para seu personagem.

Muitos filmes tentaram fazer isso, resultando em roteiros cada vez mais razos e cenas de ação mais fantásticas e inverossimeis a cada filme. Houve uma inversão do que era feito antes, agora a história era apresentada em pequenos momentos para ligar uma cena de ação a outra de forma que tudo não ficasse sem sentido nenhum, semelhante ao que se fazia nos jogos.

7. Realismo


Os filmes de Indiana Jones traziam uma novidade, a de que o heroi pode se machucar e sangrar, contanto que no final vencesse o desafio imposto. Rocky Balboa, mais uma vez, seguia junto com Indy nesta toada, fazendo aquela geração rir dos filmes de 007 e seus heróis que nunca despenteavam o cabelo.

Depois houve um avanço na busca por cenas que demonstrassem mais realismo, com fumaça, terra e sangue sujando tudo, até a própria tela, pra causar uma imersão maior do público. Bom exemplo disso vem do próprio Spielberg, com seu O Resgate do Soldado Ryan. Depois disso, filmes como Paixão de Cristo exploraram a tortura do seu personagem, Jesus, a níveis quase sádicos. Perto disso os machucados do Indy pareciam leves arranhões.

8. Atores principais já não são os queridinhos da vez


Dizem as lendas, e os extras dos DVDs, que quando Spielberg fez Caçadores queria um ator desconhecido pro papel principal. Mas Lucas o convenceu a chamar Ford, já famoso por dar vida a Han Solo em Star Wars. Ford fez um trabalho brilhante, e repetiu a dose em vários outros filmes, como Blade Runner, O Fugitivo, Força Aérea 1, se tornando o astro do século. Seu nome ligado a Indiana Jones sem dúvida pesava muito. Os anos se passaram, e Ford não é mais tão conhecido das novas gerações. Por isso a necessidade de trazer atores da vez como Shia LaBeouf e Phoebe Waller-Bridge.

9. Spielberg não significa mais diversão como antes


Falar de Spielberg nos anos oitenta e noventa remetia imediatamente a uma coisa: diversão. Não importava se ele tinha dirigido, ou só apadrinhado. Era uma marca com garantia de satisfação. É difícil manter essa fama em dia, embora ele continue sendo um grande diretor. Mas a frequência de seus filmes diminuiu, e a de filmes de aventura aumentou em nível vertiginoso. Outros nomes foram surgindo, como Tarantino, Anthony e Joe Russo, Chistopher Nolan, que passaram a carregar este legado da diversão garantida, e Spielberg ficou mais conhecido pelos filmes mais sérios como A Lista de Schindler, A.I. e Cavalo de Guerra, pra essa nova geração, ainda que nesse meio tempo ele tenha feito também As Aventuras de Tintim e Jogador número 1.

10. Dificuldade em se reinventar

Os filmes de Indiana Jones têm um conjunto de ingredientes que são típicos deles, são sua assinatura. Todos tem trilha sonora clássica, do mestre John Willians, o Indy sempre viaja o mundo de jaqueta, chapeu e chicote, todos tem cenas nojentas com insetos ou animais pequenos, todos tem um sujeito grandão pro Indy trocar socos. Estes elementos são ótimos, como os Beatles eram fantásticos quando usavam cabelo cortado tigelinha e cantavam Love me do, mas o próprio John Lennon disse um dia que quando tudo está pronto, é hora de mecher, desfazer e fazer de novo diferente. Talvez esteja faltando esta coragem para os produtores de Indiana Jones. Passar o bastão para James Mangold foi um bom começo, incluir  Sympathy For The Devil no trailer mostra que estão atentos a essa necessidade de avançar, de quebrar o modelo pra ele não se tornar mais uma relíquia empoeirada. Um pouco mais de ousadia, contudo, parece ser justamente o que os críticos mais sentiram falta até agora.

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