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MUSEUS DE FAVELA: Preservando a Identidade e a História das Periferias

No Museu de Favela, parte da Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro, o acervo é composto por casas, muros, ruas e cerca de 20 mil moradores, representando o modo de vida dessas comunidades.

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Museu da Favela

No Rio de Janeiro, especificamente em um muro da favela do Cantagalo, um grafite retrata uma mulher carregando uma lata na cabeça, rememorando os tempos em que a falta de abastecimento de água obrigava as pessoas a se virarem como podiam. Avançando um pouco mais, na favela do Pavãozinho, a imagem mostra cinco policiais sisudos. Essa representação remete a uma época em que eles vigiavam os moradores e proibiam a construção de casas de alvenaria. Com um pouco mais de esforço, chegamos à casa no Pavão, onde encontramos referências às brincadeiras das crianças na comunidade, como bola de gude, pipa e amarelinha.

museus de favela

Essa é a descrição de uma visita a um museu diferente dos tradicionais, onde se encontram pinturas renascentistas ou artefatos arqueológicos. No Museu de Favela, parte da Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro, o acervo é composto por casas, muros, ruas e cerca de 20 mil moradores, representando o modo de vida dessas comunidades. O museu defende um conceito amplo de museu, incluindo espaços de memória, experiências coletivas e ações voltadas para educação, entretenimento e conhecimento.

Fazem parte dessa rede outros museus, como o da Maré, Sankofa da Rocinha, do Horto, o da Arte e da Cultura Urbana, e o Ecomuseu Rural de Barra Alegre. Eles se encontram regularmente para trocar experiências sobre as comunidades e os movimentos sociais que representam. O objetivo principal da rede é ampliar a diversidade de vozes e narrativas históricas da sociedade.

Diferentemente dos museus tradicionais, que costumavam adotar uma perspectiva distante em relação às comunidades marginalizadas, os museus sociais permitem que essas comunidades falem por si mesmas, sem a necessidade de intermediação. Mario Chagas, museólogo, poeta e diretor do Museu da República e membro da rede, explica que os museus sociais trazem uma experiência na primeira pessoa, singular e plural.

O Museu de Favela foi criado em 2008 como uma organização não governamental (ONG) liderada por moradores das favelas Cantagalo, Pavão e Pavãozinho. Diante das frequentes visitas de turistas às ruas e becos, eles decidiram contar a história das comunidades por meio de grafites nos muros das casas. O projeto incluiu a participação ativa dos moradores na decisão do que seria grafitado nos muros.

Já o Museu das Remoções, localizado na Vila Autódromo às margens da Lagoa de Jacarepaguá, apresenta uma configuração diferente. Em vez de casas, o acervo é composto por escombros e memórias das famílias que viveram ali. Esse museu foi criado em 2016 para preservar a memória das famílias removidas devido à construção do Parque Olímpico e de outras estruturas para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. A visita ao museu inclui um percurso pelas ruas da comunidade, onde os moradores remanescentes compartilham histórias de violência e resistência.

A Rede de Museologia Social do Rio de Janeiro faz parte de um movimento de transformação do conceito tradicional de museu. Os primeiros museus eram marcados por critérios elitistas e excludentes, e essa abordagem se espalhou de forma hegemônica pelo mundo até meados do século XX. A definição mais atual e abrangente de museu, estabelecida pela 26ª Conferência Geral do Conselho Internacional de Museus (Icom), em Praga, na República Tcheca, descreve os museus como instituições permanentes a serviço da sociedade, que pesquisam, colecionam, conservam, interpretam e expõem patrimônio material e imaterial, promovendo a diversidade e a sustentabilidade.

Os museus sociais são coerentes com essa definição, mas não estão presos a definições rígidas ou legitimados por organismos internacionais ou critérios acadêmicos. Segundo Mario Chagas, qualquer iniciativa comunitária que envolva espacialidade, temporalidade e engajamento na preservação da memória pode ser considerada um museu. A Rede de Museologia Social promove a união e o intercâmbio com mais de 50 iniciativas no Rio de Janeiro, buscando causas comuns, como o combate ao racismo, à LGBTfobia e a defesa dos direitos humanos e das comunidades marginalizadas.

Esses museus sociais evitam o apagamento de grupos sociais e culturas, preservando suas tradições, memórias e heróis. Eles valorizam a identidade e fortalecem os direitos das pessoas, servindo como ferramentas poderosas de luta. O objetivo principal desses museus é trazer visibilidade para as favelas, fazer suas histórias circularem e reconhecê-las como patrimônios das cidades. Dessa forma, essas comunidades podem preservar suas memórias e tradições, evitando que se percam com o tempo.

Fonte: Agência Brasil

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