Suzanne Collins é um fenômeno, e a série Jogos Vorazes mostra como ela é competente para criar tramas envolventes e realistas num universo distópico. Mas de onde veio tanto talento? Conheça um pouco dos segredos dessa escritora sensacional.
Tempo de Leitura: 14 min
Muito antes de Jogos Vorazes
Para muitos leitores jovens, o nome Suzanne Collins está inevitavelmente associado à série Jogos Vorazes, mas sua trajetória como escritora começou bem antes do sucesso estrondoso dessa distopia. Com uma carreira que transitou entre a literatura e o mundo da televisão, Collins construiu sua identidade criativa ao longo dos anos, influenciada por experiências pessoais e por uma paixão pela narrativa.

Uma Infância em Bases Militares
Suzanne Collins nasceu em 10 de agosto de 1962, na cidade de Hartford, Connecticut, nos Estados Unidos. Filha de um militar da Força Aérea, Suzanne cresceu em um ambiente que enfatizava a disciplina, o dever e o conhecimento histórico. Seu pai, Michael Collins, serviu no Exército dos EUA e participou da Guerra do Vietnã. Esse aspecto da vida familiar teve um impacto profundo na maneira como Suzanne via o mundo e, posteriormente, na forma como abordaria temas de guerra e sobrevivência em seus escritos.
Por ser filha de um militar, Suzanne Collins e sua família mudavam-se com frequência, o que lhe proporcionou uma infância repleta de novas experiências, mas também marcada pela necessidade de constante adaptação. Ela passou parte da infância em bases militares e conviveu com a realidade das consequências de conflitos armados, um tema que mais tarde se tornaria central em sua escrita.
Desde cedo, Suzanne Collins demonstrou interesse por histórias e livros. Sua paixão pela literatura foi alimentada tanto pelo acesso a diferentes culturas devido à vida itinerante quanto pelos ensinamentos de seu pai, que lhe oferecia um panorama sobre história e estratégias militares. Essa educação diversificada a ajudou a desenvolver um olhar crítico para questões sociais e políticas, algo que, mesmo nos primeiros anos de sua carreira, começava a se refletir em seus trabalhos.
Formação Acadêmica e Influências Literárias
Ao concluir o ensino médio, Suzanne Collins decidiu seguir uma formação voltada para a arte e a comunicação. Ela ingressou na Universidade do Alabama, onde estudou Artes Cênicas. Posteriormente, continuou seus estudos na Tisch School of the Arts, da Universidade de Nova York, onde se especializou em escrita dramática e comunicação. Esse percurso acadêmico foi essencial para o desenvolvimento de suas habilidades narrativas, especialmente no que diz respeito à estruturação de roteiros e ao desenvolvimento de personagens.
Durante seus anos na universidade, Suzanne Collins foi fortemente influenciada por diferentes formas de narrativa, desde os clássicos da literatura até os roteiros de produções teatrais e cinematográficas. Sua exposição a diferentes mídias e estilos de contar histórias foi determinante para seu futuro profissional. A imersão no mundo do teatro e da televisão lhe proporcionou uma compreensão profunda sobre diálogos, estrutura de enredo e ritmo narrativo, elementos que mais tarde se tornariam característicos de sua escrita.
O que Suzanne Collins gostava de ler?
Desde pequena, Suzanne Collins foi uma leitora voraz. Uma de suas maiores influências literárias veio da mitologia grega e romana, que aprendeu a amar durante seus estudos. Obras como A Ilíada e A Odisseia, atribuídas a Homero, despertaram nela um interesse pelo heroísmo, pela tragédia e pelos desafios que moldam os protagonistas. A estrutura narrativa dessas epopeias inspirou muitos dos temas presentes em sua escrita, especialmente a jornada do herói e os dilemas morais que envolvem seus personagens.
Outro grande impacto em sua formação literária veio da literatura distópica. Autores como George Orwell (1984), Aldous Huxley (Admirável Mundo Novo) e William Golding (O Senhor das Moscas) influenciaram sua percepção sobre o papel do poder, da opressão e da resiliência humana em cenários de grande adversidade. Esses temas se tornariam essenciais em seus trabalhos futuros, refletindo sua preocupação com questões políticas, sociais e psicológicas.
Além disso, Suzanne Collins também foi profundamente influenciada por autores clássicos da literatura infantojuvenil, como J.R.R. Tolkien (O Senhor dos Anéis) e C.S. Lewis (As Crônicas de Nárnia). A forma como esses escritores criaram mundos complexos e imersivos serviu de inspiração para a construção dos cenários em suas próprias histórias. Além disso, ela admirava a capacidade desses autores de equilibrar fantasia e reflexões sobre a condição humana, algo que se tornaria um aspecto essencial de sua escrita.
O Início da Carreira de Suzanne Collins na Televisão
Antes de se tornar uma escritora reconhecida no mundo literário, Suzanne Collins deu seus primeiros passos como roteirista de programas de televisão voltados para o público infantojuvenil. Durante a década de 1990, trabalhou em vários programas da Nickelodeon, incluindo Clarissa Sabe Tudo e Os Fantasmas de Scrooge. Seu trabalho na emissora infantil mostrou sua habilidade em criar histórias envolventes e dinâmicas para um público jovem, uma experiência que mais tarde se refletiria em seus livros.
Um dos momentos mais significativos dessa fase de sua carreira foi sua contribuição para a série animada Os Mistérios de Shelby Woo, um programa policial juvenil que combinava mistério e investigação. Esse tipo de narrativa, que estimulava o pensamento crítico e a resolução de problemas, foi um dos aspectos que Suzanne Collins levou para sua própria escrita literária.
Seu talento como roteirista não passou despercebido, e ela logo foi convidada a trabalhar em outros projetos televisivos. Uma de suas principais contribuições foi para Little Bear, uma série animada baseada nos livros de Else Holmelund Minarik, onde Suzanne Collins ajudou a adaptar as histórias para o formato televisivo. O sucesso de seu trabalho a consolidou na indústria da televisão infantil e a preparou para dar um passo adiante: a criação de suas próprias histórias.
Da Televisão para os Livros
Apesar de ter uma carreira consolidada na televisão, Collins sentia a necessidade de explorar histórias mais profundas e complexas do que o formato televisivo permitia. Inspirada por sua paixão por mitologia e fantasia, ela decidiu se aventurar na literatura. O primeiro grande projeto de Suzanne Collins foi Gregor, o guerreiro da superfície, uma série de fantasia que seguia a jornada de Gregor, um garoto que descobre um mundo oculto sob Nova York.
A influência de autores como Tolkien e Lewis é evidente nessa fase, especialmente na construção do universo subterrâneo, repleto de criaturas fantásticas e regras próprias. Além disso, os temas de guerra e sacrifício, que ela havia absorvido tanto de sua infância quanto de suas leituras de literatura clássica, estavam presentes na série.
Seu tempo como roteirista a ajudou a estruturar suas histórias de forma envolvente, garantindo que cada capítulo terminasse com um gancho que incentivasse o leitor a continuar. Sua experiência em diálogos também contribuiu para tornar seus personagens mais autênticos e cativantes, uma característica que se tornaria marca registrada de seu estilo.
Gregor, O Guerreiro da Superfície | Um Mundo Fantástico bem abaixo de Nós
Um garoto de onze anos (Gregor), que vive em Nova York com sua família, mas engana-se quem acha que sua vida é tranquila. Ela é marcada por dificuldades, especialmente após o desaparecimento de seu pai, um evento que deixou sua família emocional e financeiramente abalada. Um dia, enquanto cuidava de sua irmã mais nova, Boots, Gregor cai acidentalmente por um duto de ar e acaba em um mundo subterrâneo conhecido como Submundo.
O Submundo é um lugar habitado por seres humanos pálidos e de olhos violeta, além de criaturas gigantes como baratas, ratos, aranhas e morcegos. Ao chegar, Gregor descobre que sua presença no local pode estar ligada a uma profecia antiga que fala sobre um guerreiro vindo da superfície para mudar o destino daquele mundo. Apesar de sua descrença inicial, Gregor acaba sendo envolvido em uma perigosa missão que pode não apenas afetar a vida dos habitantes do Submundo, mas também trazer respostas sobre o paradeiro de seu pai desaparecido.
Elementos Fantásticos e Temas Profundos
Uma das características marcantes de Gregor, o Guerreiro da Superfície é a forma como Suzanne Collins mistura elementos clássicos da fantasia com questões filosóficas e sociais. O Submundo é um cenário vibrante e ameaçador, onde alianças são feitas e desfeitas rapidamente, e cada criatura tem um papel complexo dentro da hierarquia subterrânea. Os humanos que vivem no Submundo, conhecidos como Regalianos, têm uma relação tensa com outras espécies, especialmente os ratos, que são considerados inimigos mortais.
O livro também aborda questões profundas, como o peso das expectativas e o impacto da guerra. Gregor, um garoto comum, é forçado a assumir uma responsabilidade que nunca desejou. Sua jornada não é apenas sobre enfrentar inimigos físicos, mas também sobre entender seu papel no mundo e lidar com o medo, a perda e a coragem. Suzanne Collins, que cresceu ouvindo histórias sobre a guerra através de seu pai, um veterano militar, incorpora em sua narrativa reflexões sobre os horrores dos conflitos e as consequências das batalhas para todas as partes envolvidas.
Personagens Cativantes
Além de Gregor, a história conta com uma galeria de personagens memoráveis. Boots, sua irmãzinha de apenas dois anos, traz momentos de leveza e inocência ao enredo. Mesmo em meio a perigos, sua presença lembra Gregor do que realmente importa. Luxa, a jovem princesa do Submundo, é uma personagem forte e determinada, cujo senso de responsabilidade e fardo de liderança refletem dilemas enfrentados por jovens em posições de poder.
Outros personagens, como Ripred, um rato sarcástico e extremamente inteligente, e Ares, um morcego leal, mostram como mesmo os antagonistas ou criaturas temidas podem ter profundidade e complexidade.
Os relacionamentos entre os personagens são fundamentais para a narrativa. Gregor começa a perceber que não há um lado completamente bom ou mau na guerra e que cada criatura do Submundo tem sua própria história e motivações. Essa complexidade torna a leitura ainda mais envolvente, pois desafia os leitores a enxergar diferentes perspectivas e refletir sobre preconceitos e alianças improváveis.
Destino e Escolha
Um dos temas centrais do livro é a relação entre destino e livre arbítrio. Gregor é constantemente confrontado com a ideia de que sua chegada ao Submundo já estava prevista, mas ele luta contra a noção de que não tem controle sobre sua própria vida. À medida que a história avança, ele percebe que, embora profecias possam indicar possibilidades, são suas escolhas que definem seu verdadeiro caminho. Esse conceito ressoa profundamente com jovens leitores, que também enfrentam a transição para a adolescência e as primeiras grandes decisões da vida.
Para os leitores que gostam de fantasia, aventura e reflexões profundas sobre a vida, Gregor, o Guerreiro da Superfície é uma excelente escolha. Suzanne Collins cria um mundo envolvente, com personagens bem desenvolvidos e uma trama cheia de emoção. Além da ação e do suspense, o livro traz mensagens importantes sobre coragem, empatia e responsabilidade.
O Fenômeno “Jogos Vorazes”
A carreira de Suzanne Collins já poderia se considerada de sucesso até aquele momento, mas não há dúvidas de que nada se compararia ao que estava por vir. O alcance mundial de Jogos Vorazes colocaram ela definitivamente em evidência, e o seu desafio dali em diante seria conseguir se manter à altura da expectativa que os fãs colocavam em suas mãos. Mas o fenômeno que se tornaria Jogos Vorazes não começou do dia pra noite.
Quando o primeiro livro foi lançado, em 2008, a tiragem inicial foi de 200 mil cópias, um número expressivo, mas ainda modesto para o gênero. No entanto, o boca a boca e as críticas positivas impulsionaram rapidamente as vendas, levando a várias reimpressões.
O livro entrou para a lista de best-sellers do The New York Times e logo se tornou um dos títulos mais vendidos do gênero jovem-adulto. Com o lançamento dos volumes seguintes, Em Chamas e A Esperança, a popularidade da série explodiu, alcançando milhões de leitores ao redor do mundo e sendo traduzida para dezenas de idiomas.
A Inspiração por Trás da Trilogia
A influência mais direta de Suzanne Collins veio da televisão. Ela menciona que a ideia surgiu quando ela zapeava entre canais e percebeu um contraste marcante: de um lado, reality shows competitivos onde os participantes faziam de tudo para vencer; do outro, imagens reais de guerras e conflitos armados sendo transmitidas nas notícias. Essa justaposição de entretenimento e sofrimento a fez refletir sobre como a sociedade consome a violência como espetáculo.
Outro elemento importante foi sua formação clássica. Suzanne Collins estudou literatura e teatro, tendo um grande interesse por mitologia grega. A história de Teseu e o Minotauro foi uma influência essencial na criação dos Jogos Vorazes. No mito, atenienses eram obrigados a enviar jovens para lutar contra o Minotauro em um labirinto como forma de tributo a Creta. Esse conceito de um sacrifício forçado para manter uma sociedade sob controle se reflete diretamente na trama do livro.
Além disso, Suzanne Collins cresceu ouvindo histórias sobre guerra contadas por seu pai, e provavelmente por outros militares que ela conheceu nas bases militares onde cresceu. Seu pai a ensinou sobre estratégias de guerra, sobrevivência e os impactos devastadores dos conflitos. Essas lições estão presentes em toda a série, especialmente na forma como a protagonista, Katniss Everdeen, se torna uma sobrevivente e uma figura de resistência.

Panem – Uma Distopia Brutal
O mundo de Jogos Vorazes se passa em Panem, uma nação localizada no que antes era a América do Norte. O país é formado por uma capital rica e poderosa, a Capital, que controla os doze distritos restantes com mão de ferro. Cada distrito tem uma função específica e seus habitantes vivem sob um regime autoritário, marcado por pobreza, fome e repressão.
Os Jogos Vorazes, que dão nome à série, são um evento anual criado pelo governo para manter a população sob controle. Como punição por uma rebelião ocorrida no passado, cada distrito é obrigado a enviar dois jovens, chamados de “tributos”, para uma arena onde devem lutar até a morte. O evento é transmitido ao vivo e tratado como um grande espetáculo, misturando crueldade e entretenimento.
Esse conceito reflete críticas sociais sobre desigualdade, opressão governamental e o papel da mídia na manipulação das massas. Suzanne Collins construiu uma distopia crível, onde a disparidade entre ricos e pobres é extrema e o governo usa o medo para manter sua soberania.
Os Primeiros Passos na Construção da História
Para dar vida a esse mundo, Collins precisou estruturar cuidadosamente cada detalhe. Primeiro, desenvolveu Panem e seus distritos, definindo suas funções econômicas e a relação entre eles. Depois, criou os Jogos Vorazes como um evento histórico dentro da narrativa, estabelecendo suas regras, a seleção dos tributos e a dinâmica da arena.
O próximo passo foi criar a protagonista, Katniss Everdeen. Diferente dos heróis tradicionais, Katniss não busca liderar uma revolução ou se tornar um ícone. Ela é uma jovem que aprendeu a caçar para alimentar sua família e cujo maior objetivo é sobreviver. Sua jornada de crescimento ao longo da trilogia é um dos aspectos mais marcantes da obra. Suzanne Collins queria que sua protagonista fosse realista e complexa, com dúvidas, medos e forças que a tornassem humana.
Outro elemento essencial foi a narrativa em primeira pessoa. Isso permitiu que os leitores experimentassem os Jogos Vorazes diretamente pelos olhos de Katniss, sentindo suas emoções e sua luta para sobreviver. Esse estilo de escrita também aumenta a tensão e a imersão, tornando cada momento da história ainda mais impactante.
Por que Jogos Vorazes se Destacou?
Muitos livros distópicos existiam antes de Jogos Vorazes, mas poucos alcançaram o mesmo impacto. O que fez essa trilogia se tornar um marco na literatura jovem-adulta? Além do enredo emocionante e da construção de mundo detalhada, Suzanne Collins conseguiu trazer uma protagonista autêntica e relacionável. Katniss não é uma heroína clássica, mas uma jovem comum colocada em uma situação extrema.
A série também se destacou por sua crítica à sociedade moderna. Questões como a espetacularização da violência, a desigualdade social e a manipulação da informação pela mídia tornaram a história relevante e atemporal.
Com sua mistura de mitologia, história e crítica social, Jogos Vorazes conquistou milhões de leitores e permanece uma das distopias mais influentes da literatura contemporânea. A criatividade e a profundidade da escrita de Suzanne Collins garantiram à série um lugar especial na literatura jovem-adulta e continuam a inspirar novas gerações de leitores e escritores.
Veja também: Amanhecer na Colheita | Revelações no Aguardado 4º livro de Jogos Vorazes
Conheça mais sobre livros e autores.